quarta-feira, 28 de setembro de 2011

MEUS OITO ANOS

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Como são belos os dias
Do despontar da existência !
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é – lago sereno,
O céu – um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida – um hino d’amor !

Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar !
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !

Oh ! dias de minha infância !
Oh ! meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã !
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã !

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
De camisa aberta ao peito,
- Pés descalços, braços nus -
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis !

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo,
E despertava a cantar !

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Casimiro de Abreu

terça-feira, 27 de setembro de 2011

VERSOS ÍNTIMOS

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

Augusto dos Anjos

Geraldo Vandré Quebra o Silêncio Após 37 Anos e Fala de Ditadura

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Para mim as coisas acontecem de modo bem diverso, não me importa exibir-me a um público sem face. Meu estimulo não são três, cinco mil pessoas: é você, que dentre essas me lê porque me entende, porque nesse momento de algum modo sente um vínculo de prazer comigo. – (Douglas Tabosa )

DE RELANCE

Sem nos apercebermos, vamos nos submetendo.
A essa vidinha de sempre...
Cozinhando os dias em banho-maria,
Apáticos, nem ao menos um assomo.

Cada vez mais vou me convencendo
De que não vivemos em sociedade,
Vivemos, quando muito, agrupados
E como satélites de nós mesmos.

22.09.90

DESESPERO DE CAUSA

Quero chorar meu pranto amargo,
Fruto do tempo.
A ausência de perspectivas,
O pessimismo coerente.
Quero lamentar o horizonte negro...
Meus pés, minhas mãos atados
Por invisíveis correntes.

Quero meus sentimentos vivos,
Expostos ao sol do meio-dia,
Como uma humilde reação de protesto.

03.12.88
Da mais alta janela da minha casa, com um lenço branco, digo adeus aos meus versos que partem para a Humanidade. E não estou alegre nem triste. Esse é o destino dos versos. Escrevi-os e devo mostra-los a todos, porque não posso fazer o contrário, como a flor não pode esconder a cor, nem o rio esconder que corre, nem a árvore esconder que dá fruto. (Alberto Caeiro-heterônimo de Fernando Pessoa)