quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

ANIVERSÁRIO NO SUBÚRBIO

Desde o momento que acordamos,
Concordemos, a vida passa...
A vida escorre dos dedos distraídos,
Minutos preciosos são perdidos,
Para sempre desperdiçados.
O tempo não passa rápido
É mal aproveitado.

O sol me cerca de todos os lados...
E é até um pecado, eu nessa cadeira,
Quando há tantos, definitivamente, sentados.

O domingo me acusa desse crime hediondo.
Diz, vamos aos festins dos mortais,
Dos que não querem mais nada,
Que a alegria embriagada de suas vielas.
Da fumaceira cheirosa
Dos seus quitutes ensebados
A escore-lhes dos lábios.

E o que é alegria, afinal,
Alegria não é uma alegoria,
Alegria é um estado de espírito,
Bem físico por sinal.

25.01.2010

O OCASO DA EXISTÊNCIA

Todos os caminhos terminaram.
A motivação acabou,
Feneceu feito uma flor.
Não há nada mais a fazer
Senão assistir a vida resumida
A uma sucessão de dias:
Acordar e dormir...

Vagar como um barco,
Barco não, barco tem sua graça,
Um pedaço de tronco.
Perder, afinal, por si,
Todo encanto.
Viver sem saber por que,
Pela simples obrigação de existir.

02.03.2010

ENQUANTO HÁ TEMPO

Estou ficando velho, e isso é um fato.
A palavra senhor pesa-me
Como um fardo.

Se a gente pintasse o cabelo
E, realmente, enganasse o tempo.
E o estacionasse a cada tingimento.
Se se pudesse envernizar
As células do corpo
E engomar as rugas da pele...

Envelhecemos desde o dia que nascemos,
E cada dia a mais é um dia a menos.

21.05.2011

domingo, 4 de dezembro de 2011

ANTI-MENSAGEM DE NATAL

Meu imaculado menino
Tua imagem já não mais seduz
Como uma boa propaganda de cigarros.

Os fariseus, de outrora,
Agora são mais idolatrados.
Erguemos, ainda, nossos bezerros de ouro
E nos curvamos.
E mais do que antes,
É mais fácil um elefante
Passar pelo fundo de uma agulha
Que um rico entrar
No reino dos céus.

Meu imaculado menino,
Hoje os falsos profetas,
Legítimos capitalistas,
Congregam a multidão
E comercializam a fé;
Enquanto teus ditos discípulos,
Encerrados no templo,
Como omissos Pilatos,
Vivem lavando as mãos.

Meu imaculado menino
Teu sacrifício foi a esmo
O mundo continua o mesmo.

sábado, 3 de dezembro de 2011

O Nosso Mundo

Eu bebo a Vida, a Vida, a longos tragos
Como um divino vinho de Falerno
Poisando em ti o meu olhar eterno
Como poisam as folhas sobre os lagos...

Os meus sonhos agora são mais vagos
O teu olhar em mim, hoje é mais terno...
E a Vida já não é o rubro inferno
Todo fantasmas tristes e presságios!

A Vida, meu amor, quero vivê-la!
Na mesma taça erguida em tuas mãos,
Bocas unidas hemos de bebê-la!

Que importa o mundo e as ilusões defuntas?...
Que importa o mundo e seus orgulhos vãos?...
O mundo, Amor! ... As nossas bocas juntas!...

Florbela Espanca

Amar

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui…além…
mais este e aquele, o outro e toda a gente..
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disse que se pode amar alguém
durante a vida inteira é porque mente.

Há uma primavera em cada vida:
é preciso cantá-la assim florida,
pois se Deus nos deu voz foi prá cantar

E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
que seja minha noite uma alvorada,
que me saiba perder…prá me encontrar…

Florbela Espanca

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

PAISAGEM

Teus cabelos
É um mar de pelos.
O vento bate.
Acaricia.
Levanta as ondas
Que derramam
Nas areias claras
De teus ombros.

ACORDEI NUMA BOA

Hoje a manhã está linda.
Amanhã eu não sei.
O pássaro canta,
O gato passa num canto...
Em algum canto, apesar desse sol,
Alguém morre
E ficará só...

Ninguém repara nessa manhã de vidro.
Absorvidos em seu mundo particular,
Com sua urgência sem sentido.

Ninguém pensa que amanhã,
Talvez não haja a manhã.
Só os loucos, feito eu,
Os pássaros, as crianças,
Assistem, agora, a sua dança.

27.06.2011