sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Desencanto


Já não se escrevem mais  poemas,
Escreve-se memorandos e ofícios;
Já não se tem mais apreço,
Tem-se um preço, um custo;
Já não há mais relacionamentos,
Há um pacto, um contrato;
Já não se tem mais amor,
Tem-se um caso, um passatempo;
Já não somos mais humanidade,
Somos um aglomerado, um agrupamento.

Fábio Murilo

Amigos - Vinícius de Moraes

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Serenidade



Há uma razão em meus dias sem razão,
A morte não parece tão viva.
Há no ar uma canção,
Uma vontade de viver,
Uma excitação inconsequente,
Uma eloquente satisfação.
Sopra em mim uma brisa afável,
De final de tarde,
Como se nunca fosse tarde
E a vida estivesse só começando,
E eu remoçando.
O agora passando docemente 
Num amanhã sem planos.

Fábio Murilo, 03.06.2012

Das Vantagens de Ser Bobo - Clarice Lispector

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O Homem Invisível


Penso nos desafortunados da sorte,
Os que esperam da vida que é morte.
Nos que não se dão ao luxo,
Se dão ao lixo.
Passam pela vida sem serem notados,
São inócuos, indiferentes, indigentes.
Povo sem outro objetivo
Que o de permanecer vivo
Como os cães, as flores,
A grama do jardim, a lua na rua...

Falência de gente,
Entulhos de vida,
Sobrevidas carentes.
Não incomodam,
 Nem são percebidos,
Como uma nódoa
No pano encardido.

Fábio Murilo-14.03.2013

O Operário em Construção - Vinicius de Moraes

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Simples Assim

 O que eu sinto por ti
Transcende as fronteiras,
Pretende ser estrela
Em teu céu interior.

O que eu sinto por ti
É apenas o que sinto
E consinto em existir.
É o elixir da juventude
Que me revigora
E me enche de ânimo.

O que sinto por ti
É o antônimo do que
Tenho sido.
É um frescor de fim de tarde,
É um agradável odor
De onde não se sabe.

O que eu sinto por ti
É algo sem futuro
Nem presente,
Me faz feliz simplesmente,
Inadvertidamente sorrir.

Fábio Murilo, 10.01.2014

A Quoi Ca Sert L'amour - Edith Piaf (legendado)

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

A Estrada


Quando eu passar por aqui
Não ficarão meus rastros.
Meu rastro ficará gasto quando eu partir.
Meus tropeços, meus saltos,
Não ficará um só passo.
Depois que eu ir.
Hoje sorrio, amanhã a chorar,
O que eu sou será apagado
Na margem do rio, na beira do mar.
Serei apenas um fato esquecido,
Alguma coisa que terá insistido em existir.
No final, só a mim mesmo terei amado,
Como se aqui não tivesse passado,
Quando eu passar por aqui. 

Fábio Murilo, 21.04.2012




Tabacaria - Fernando Pessoa / Antônio Abujamra